há pouco mais de um mês, caminho na liberdade todos os dias com L, por uma hora, 4 vezes por semana. e como nosso horário é sempre o mesmo, trombamos todos os dias com muitos dos mesmos caminhantes. a praça é cheia de tipos interessantes. tem o flautista trovador, que todos os dias está sentado num banquinho da alameda lateral, tocando nenhuma música identificável. ele não é lá muito bom no que faz, e brincamos com G - que por vezes nos acompanha - que ele faz serenata pra ela. tem quilômetros de senhorinhas ancudas. tem um punhadinho de gatinhas saradas balançando o cabelo preso em rabo-de-cavalo enquanto correm. tem vários senhorzinhos safenados andando a passo muito mais rápido que o nosso. tem um anão cego que caminha no contrafluxo tateando sua bengala num som ritmado (mas desse eu tenho medo, e um dia eu posto sobre o meu medo de anões). e tem dois sujeitos que tornam a caminhada mais interessante em termos observatórios e especulativos.
o primeiro foi apelidado por nós de "o universitário". ele passa sempre no mesmo horário, e não é um caminhante. ele é um jovem transeunte que usa o trajeto da praça pra chegar ao seu destino. vem de cabelo molhado, roupa limpa, cheiroso e bem disposto, como quem acabou de sair do banho. tá sempre com uma mochila nas costas e quase sempre de bermuda. tem 20 e poucos anos e decidimos que ele está indo pra faculdade da próxima avenida e que cursa turismo. geralmente cruzamos com ele na lateral do prédio do niemeyer. tudo muito sincronizado e estranho.
o segundo é conhecido como "havaianas". é um rapaz alto, magro, esguio e elegante, cabelos louros raspados quase rentes, olhos claros, barba aparada dando a impressão de que está por fazer. caminha no contrafluxo, quase dentro da vala lateral de paralelepípedos, com os fones de um ipod enfiados no ouvido e cruzamos com ele várias vezes pelo trajeto. sempre está sem camisa (embora esta esteja pendurada no cós da calça), de bermuda ou calça de tecido camuflado e... havaianas!
desde a primeira vez que o vimos ele se tornou um mistério. porque ele caminha de havaianas? porque ele caminha no contrafluxo? por que ele caminha tão devagar? o que ele ouve no ipod?
enquanto rapidamente conseguimos especular tudo sobre o universitário e achar explicações óbvias e plausíveis pros seus hábitos, o havaianas continua um mistério indecifrável. será que ele tem unha encravada? será que ele sofreu um acidente e está com os pés machucados e não pode se calçar nem andar mais rápido? será que é radiohead que toca em seu ipod?
hoje L. cismou que havaianas estava andando a 20 metros na nossa frente, no mesmo fluxo, de camisa e tênis! fiquei desolada...
acelerei o passo pra tentar alcançá-lo pra poder comprovar se era ele mesmo, pois não conseguia admitir que um adônis tão misteriosamente elegante tivesse se transformado naquele tipo comum de mocorongo meio cambaleante que estava à minha frente. onde estava sua altivez? e suas havaianas? e a bermuda camuflada? era o mesmo cabelo, o mesmo corpo, o ipod continuava lá, mas eu custava a acreditar que de tênis um homem pudesse andar tão menos distintamente que de havaianas. seria esse todo o segredo?
por sorte conseguimos alcançá-lo. e para o meu total alívio, não era havaianas que estava ali!
o mundo voltou a ser um lugar cheio de mistérios e de curiosidade infinita.
quarta-feira, 11 de abril de 2007
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